segunda-feira, setembro 07, 2009

Araketu en Esmeralda al 900

E como vivia já há mais de trinta anos naquela terra, as suas referências não se prendiam a muitos preconceitos bobos que ainda existem em matéria de música popular. E eu me deliciava nessa idéia, no seu gostar de ensinar, no seu português com a mesma malandragem de sempre. Ela, ela que viveu lá pros cantos da zona sul há mais de 35 anos e quando lá voltou não se reconheceu viu que a sua dor não tinha nome, cidade, país nem endereço.
E dispunha assim na mesa o repertório das canções que todos iam executar. Passava de Lígia de Tom Jobim a Caçamba do molejão num lindo piscar de olhos.
E eu estava lá, forasteiro do forasteiro, fingindo-me mais brasileiro exercendo brasilidade ao contrário, sentado na minha poltrona assistindo a apresentação do grupo mais avançado que já não mais beliscava o pandeiro.
Os primeiros acordes, o ritmo, o primeiro verso me coçaram na cabeça canção que conhecia de longe, talvez outro achado, talvez outra música livre dos preconceitos, sendo executada assim em toda a sua beleza. E a identificação maior na letra, mordendo o lábio para não chorar, vontade de sair e ter os pés nas ruas que tanto me abençoaram. E de novo, a recaída fatal, o apelo insensato aos vinhos de dez pesos e aos ouvidos alheios, je suis trés melancolique, brincando de melancolia saía cantando tal linda canção arrependendo-me de nada, consciente do absurdo da vida e da beleza maior adivinhando caminho, adivinhando penas, adivinhando reencontros, adivinhando futuras felicidades, tomando altas pílulas do já passou, agora eu sou sentimental ao extremo e não me comedirei antes do ridículo, quero o ridículo com tudo dentro, quero assim, zen, na calma adivinhar em apartamento alheio, em conversinha íntima escutar que o adeus é uma mentirinha e que tudo foi uma linda pausa na maravilhosa idéia do existir ao teu lado, no maravilhoso verso da coisa que mete medo pela sua grandeza pelo seu absurdo pela sua grandeza, ah se eu pudesse, mais forte que pretérito imperfeito é esse pretérito que termina com esse, cruel, magnânimo, irônico e extremamente traidor da poesia mais linda, da mirada mais linda do "eu queria ser bem mais..."

Nenhum comentário: