sábado, agosto 28, 2010

Carta para Charlotte que virou poema.

Vagabunda, tu bem sabias que não era pra ser assim, tu bem sabias que o meu sonho era outro e que tudo, tudo o que eu tinha feito tinha a única finalidade de te fazer feliz. Ah, minha dor, como é grande a minha dor, atemporal, feia e absurda. Que ficção o quê, ficção é o caralho, caralho esse que você não tem para se fuder assim bem fundo, sua vadia de merda. Verme infecundo, já limpei a casa toda, joguei fora a sua toalha, seus bibelôs, seu feng-shui de quinta que atolava a minha pobre sala. Troquei fechadura, queimei incenso e rasguei foto. Não direi que sou livre pois agora essas paredes me oprimem, pois agora a angústia das cinco horas da tarde, da tarde que cai, inexorável me deixa assim completamente nua, completamente eu, presa ao meu mais puro de mim, bobinha, tola, abrindo a geladeira, acreditando em essências, chorando com livrinhos de figuras de animaizinhos dormindo, ah por favor, deixe as rimas para mais tardes que carta de amor eu já não consigo mais escrever e não vem com isso não, não vem com isso não, não vem me enfiando a sua piedade goela abaixo meses depois batendo no meu apartamento, tatuagem nova, óculos escuros, novo corte de cabelo e um novo amor na boca, não vem não que eu sou passional, assassina, tenho raiva, ódio e ojeriza, minha querida, indiferença é para os fracos, há paixão aqui nesse sangue, quebro barraco, boto fogo e bato mesmo, bato assim lá no fundo. Não me apareça nunca mais com a sua cara lavada de ser angelical, tenho eu olho mágico pra esquadrinhar a tua espera no batente da porta, no teu suor tímido e ansioso de janeiros sem brisa. Rábica, não faço a linha da megera domada.

Abro a porta fingindo tempo passado, convido pra entrar, disquinho maneiro na vitrola, bebidinha e conversas no sofá


ofídica, rondo o ninho, espero o seu sono


felina mio quieta


canina marco território


humana, copiosamente humana,


te escrevo sonetos, rimas perfeitas, chineses vasos em higiênicos papéis


que limparão de uma vez por toda a sua consciência.


Boba.

Um comentário:

Isadora P. disse...

"Boba", como você diz, é a cereja no topo, Henriquezinho!

Vi que me ligou, respondi por facebook.

Beijos, beijos!

Ps: Seria bom se todas as cartas virassem poemas, não é verdade?