De quando é preciso dizer para as letras que não elas não
dominam a gente. Isso é voz. Isso é consciência. Qualquer tentativa de lapidação
do estilo é uma falácia
Da vez que ela veio aqui pra casa depois quase um ano sem vir ela chegou com um biquíni e
uma tanga enrolada na bolsa.
Praia dá um tesão.
Fazia tempo que ela não batia na minha porta. Mas eu sabia que
um dia ela bateria com tanga ou não, pois ela sempre volta.
Eu não gosto de escada pra subir não, ficar subindo escada,
ficar ouvindo alguém subindo a escada, os passos se aproximando. Naquele dia
foi assim, os passos iam inundando o apartamento de qualquer coisa que
desestabilizava que me tirava do chão e me jogava num alto mar.
Eu fiquei como o naufrago, nem lutei contra a correnteza e as
ondas. Engoli água e apressei o mergulho final.
E quando fui atender a porta já era como uma sereia, uma
criatura do mar.
É claro que eu ia botar a tanga na bolsa também. Já no final de
setembro comia cenoura todo dia e castigava nas manhãs com cenoura e bronze,
dourava os meus pelos e fazia tatuagens de rena.
Ela chegou no final de dezembro. Eu já estava marrom, pele, cabelo,
corpo, eu estava pronta. E ela? Ela uma Amazona, uma Tuaregue, esguia, solar.
Durou até o final de fevereiro. Não foram só as quatro semanas
de amor de Luan e Vanessa. Houve mais do que isso. Talvez o dobro.
Nos entupíamos de salada de fruta, passávamos o dia a base de sol e picolés, frutas e água. Quando o sol se punha a gente
comia comida mesmo.
O seu Cenoura e Bronze acabou e eu ainda tinha. Ainda tem,
sobrou.
Foda-se. Vou acabar com tudo nesse nosso generoso outono. Vou é
catar conchinhas, essa época dá muita, vou fazer artesanato.
Porque não sou obrigada.